quinta-feira, setembro 28, 2006

Sobre o fim de uma era

Por respeito e fraca capacidade motora, recuso-me a escrever sob o efeito do álcool. Prefiro fazê-lo ressacada.
Por convenção, aquilo que dizemos/escrevemos reflete o nosso estado de espírito. Deixo-vos aqui uma mensagem cansada, sonolenta, mal disposta, com o corpo dorido e os pés ensanguentados.
Em primeiro lugar, tenho a lamentar que não haja lugar no mundo para os anarquistas. Não gosto de regras. Raramente compreendo a sua razão de ser. Não gosto de ordem forçada. Não gosto de poder concentrado em mãos fracas demais para o sustentar. Não gosto de autoridade forjada sabe-se lá de que pressuposto de superioridade. Sou pela anarquia e tenho todo o direito a sê-lo.
Em segundo lugar, tenho a agradecer toda a empatia e consideração que as BioBácas receberam nos últimos dias. A verdade é que não passamos de um bando de gajas bêbadas, que só querem divertir-se a qualquer custo e armar confusão com quem bem nos apetecer. Ainda assim, fomos recebidas de braços abertos e com um sorriso rasgado nos lábios. Ao Pai Loza, à Madrinha, aos Avós, ao BiVô, e à restante família... MUITO OBRIGADA.
Por último, em virtude do patente desagrado revelado face à minha partipação no blog, tenho a informar que vou retirar-me por uns tempos e dedicar-me a actividades que não impliquem directamente chagar a cabeça de quem me rodeia. Espero que não percam o bom rumo que o blog tomou até então.

segunda-feira, setembro 25, 2006

Conselhos para a semana que se avizinha - parte I

1- Guronsan é patrocinador do dia seguinte. E do dia a seguir a esse. E do outro também.
2- Vinho branco dá caganeira.
3- Vinho fino embebeda rapidamente.
4- Cerveja é barata e funciona a maior parte das vezes.
5- A comida gordurosa potencia os efeitos do álcool.
6- Pés em ferida é fofinho.
7- Chuva nos cornos é fofinho.
8- Chuva nos cornos com os pés em ferida, caganeira de vinho branco, ramada de vinho fino, carteira cheia por causa da cerveja e estômago gorduroso, com a capa nos ombros a gritar por biomédicas... é de valor!

ébria way of life

Há que saber estar à beira do abismo e dar um passo em frente com orgulho. Há que acreditar que os impossíveis são possíveis e os improváveis são quase certos com um copinho de vinho na mão. Há que saber que a sobriedade não faz falta a ninguém.
Vou me calar.
Há 4 dias que devia ter me calado.

O Baquedo e o egocentrismo

Minhas amigas(que os outros interessam-me muito pouco)....
Perdoem-me ser uma Báca egocentrica... Mas, não sei se pela erva que rumino empurrada por elixir da loucura ou se pela natureza do meu ser(ou parecer, não sei se chego para ser), não sou capaz de melhor.

O Baquedo e a companhia do Binho

Saudações meus amigos, colegas Bácas e restantes dois resistentes ainda leitores desta estrumeira!
Daqui vos fala uma Biobáca no meio de um recinto povoado, mas só... Ladeada apenas por um copo de Binho Fino.
O Binho Fino é fofinho.
O Binho Fino sobe à cabeça como um foguetão... E às vezes também explode antes de sair da atmosfera.
Um copinho de Binho Fino é sempre uma boa companhia e uma boa desculpa para se fazer aquilo a que não nos atrevemos quando há somente uma Coca-cola.
Entretanto chegou outra Báca que não está sozinha.
Ela canta, pobre Biobáca. Há quatro dias mergulhada na sobriedade do néctar da vida.
O sonho é uma constante da vida. E eu sonho ser Cinderella.
Gata Borralheira já sou.
Amo-vos!

domingo, setembro 24, 2006

Sem mais nada para fazer

o binho...


Oiça lá ó senhor vinho,
vai responder-me, mas com franqueza:
porque é que tira toda a firmeza
a quem encontra no seu caminho?

Lá por beber um copinho a mais
até pessoas pacatas,
amigo vinho, em desalinho
vossa mercê faz andar de gatas!

É mau procedimento
e há intenção naquilo que faz.
Entra-se em desequilíbrio,
não há equilíbrio que seja capaz.

As leis da Física falham
e a vertical de qualquer lugar
oscila sem se deter
e deixa de ser perpendicular.

"Eu já fui", responde o vinho,
"A folha solta brincara ao vento,
fui raio de sol no firmamento
que trouxe a uva, doce carinho.

Ainda guardo o calor do sol
e assim eu até dou vida,
aumento o valor seja de quem for
na boa conta, peso e medida.

E só faço mal a quem
me julga ninguém
e faz pouco de mim.
Quem me trata como água
é ofensa, pago-a!
Eu cá sou assim."

Vossa mercê tem razão
e é ingratidão
falar mal do vinho.
E a provar o que digo
vamos, meu amigo,
a mais um copinho!


(ter em atenção que isto é um fado da Mariza, ora portanto ela é uma senhora de valor!)

Histórias bonitas Parte IV

Um homem levantava-se todos os dias de manhã e ia à casa de banho. Usava a sanita e puxava o autoclismo. Quando olhava para o remoínho da água, reparou numa aranha que lutava para sobreviver, agarrando-se à fina teia para não ser engolida pela força da água.
Passados alguns dias, comovido com a condição do pobre animal, resolveu tirá-la e deixou-a num canto da casa de banho.
No dia seguinte, levantou-se, foi à casa de banho e olhou para o sítio onde tinha deixado a aranha. Estava morta.

"Não nos devemos sobrepor à vida" disse alguém, porcurando encontrar uma moral para esta história.

A todas as aranhas com quem me cruzei, o meu sincero pedido de desculpas.

quarta-feira, setembro 20, 2006

Utilidades Parte III

* Esquece quem foste. Esquece o que querias ser. Esquece o que queres ser. Esquece o que não queres ser. Quando tentares esquecer o que és, já desapareceste.
* Ofende-te a ti próprio. Ofenderás os teus amigos. Ofenderás os teus inimigos. Ofenderás quem te ama e quem te odeia. No fim de tudo, sozinho e sem ninguém, todos resistirão a acreditar que te querias ofender.
* Dá tudo o que tens a quem amas. Ficarão felizes. Contarão contigo em qualquer situação. Nunca te agradecerão. Nunca perceberão que foi por amor. Nunca se darão ao trabalho de te tentar perceber. Nunca te perceberão. Quando já não quiseres amar mais, nada terás guardado para ti próprio.
* Esconde sempre os teus defeitos. Encobre-os com sorrisos e bom vontade. Capa o teu espírito para não magoar o dos outros. Mostra a todos o melhor de ti a todo o momento. Quando, inevitavelmente, um defeito escapar e se revelar em público, todos se decepcionarão contigo.
* Sofre a dor do amigo. Chora as suas mágoas. Dá-lhe a tua paz e a tua alegria. Esvazia-te para salvar uma alma da escuridão. Não te esqueças porém que também tens que sair do poço.

terça-feira, setembro 19, 2006

iiiiiiiiii...

Aos que chegam e aos que partem. Aos que entraram no que queriam e aos que ficaram à porta. Ás novas aquisições. Á caloirada. Á ingenuidade, á confiança e á disponibilidade. Aos gajos de preto. Á praxe. Ao protagonismo, á sabedoria e á experiência. Ao Sr. Melo. Á casa do Sr. Melo. Á receita do Sr. Melo. Ás Bacas. Ás gajas que tiveram a coragem de chamar a si próprias bacas. Ao primeiro gajo com coragem de dar a cara no nosso blog. Á nossa família. Ao pai Loza. A todos os que nos acompanharam nos bons e maus momentos. Aos bons e maus momentos. E a tudo o resto... um brinde imaculado!

segunda-feira, setembro 18, 2006

Parabéns BioBáca

Felicitações bovinas!

RIP Morangos com Açúcar

Este post serve como requiem funerário à série nº46228 dos morangos que teve hoje o seu fim, deixando assim potencialmente desempregados dezenas de jovens actores sem jeito para representar. A nº46229 começará já amanhã, portanto pouco tempo teremos para chorar esta horrível perda.
Com todo o respeito, um minuto de silêncio doloroso.

Morangos, rest in peace.

sexta-feira, setembro 15, 2006

Histórias bonitas Parte III

A Rã e o Escorpião

O fogo crepita feroz e avassalador. Na margem do largo rio que permeia a floresta, encontram-se dois inimigos: a rã e o escorpião. Lépida e faceira, a rã prepara-se para o salto nas águas salvadoras. O escorpião, que não sabe nadar, aterroriza-se ante a morte certa, estorricado pelas chamas ou impiedosamente tragado pelas águas revoltas. Arguto e num esforço derradeiro, implora o escorpião:
— Bela rã, leva-me nas tuas costas na travessia do rio!
— Não confio em ti! Teu ferrão é inclemente e mortal — responde a rã.
— Jamais tamanha ingratidão. Ademais, se eu te picar, é morte certa para nós dois.
— É verdade — pensou candidamente o bondoso batráquio. - Então suba!
E lá se foram irmanados e felizes.
No entanto, no meio da travessia, a rã é atingida no dorso por uma impiedosa ferroada. Entremeando dor e revolta, trava o derradeiro diálogo:
— Quanta maldade! — exclama a rã, contorcendo-se. - Não vês que morreremos os dois?
— Sim, responde o escorpião, mas essa é a minha natureza!

quinta-feira, setembro 14, 2006

O Baquedo e as privações

Saudações meus amigos...
A Pilinha que hoje vos fala é uma Báca mudada, transformada, calejada pela vida, pelo sofrimento, pela privação. Uma Pilinha que vocês nunca tinham conhecido.
Uma Pilinha castigada pela Liga, com um mês de inactividade e possibilidade de agravação de pena... Uma craque emprestada contra a sua vontade a um clube rasca e da Regional.P
Pois digo-vos, meus amigos... Pilinha sobreviverá! E voltará aos grandes palcos... ás grandes exibições, com o público e as colegas de equipa ao rubro.
Já falta pouco!
Amo-vos!

Porque há blogs interessantes...

Por sugestão da figura histórica mais querida deste blog, aventurei-me à descoberta de novos blogs. Desfrutem:http://www.grandecoisa.blogspot.com.

terça-feira, setembro 12, 2006

One year later

I
Believe In Our Fate
We Don't Need To Fake
It's All We Wanna Be
Watch Me Freeeaaak !!
I Say
We're Growing Every Day
Getting Stronger In Every Way
I'll Take You To A Place
Where We Shall Find Our
Roots Bloody Roots
Rain
Bring Me The Strength
To Get To Another Day
And All I Want To See
Set Us Free
Why
Can't You See
Can't You Feel
This Is Real
Ahhh
I Pray
We Don't Need To Change
Our Ways To Be Saved
That All We Wanna Be
Watch Us Freak


E o que há um ano atrás era confuso de repente é real. O medo do que íamos encontrar tornou-se uma vontade de conhecer cada vez mais. Os dias iguais tornaram se dias diferentes. Os perfeitos estranhos são agora os amigos do costume. Quebrar com tudo foi complexo, mas valeu a pena. Nunca pensei encontrar um "lar" tão depressa. Obrigada por este ano... passou a voar, mas valeu cada segundo.

segunda-feira, setembro 11, 2006

Falta o levantar cedo. Falta o trânsito. Faltam as aulas secantes. Faltam os colegas barulhentos. Faltam as refeições adulteradas. Faltam os 30 cafés por dia. Faltam os maços de tabaco vazios pousados em mesas entulhadas. Faltam os jogos de cartas. Faltam os cumprimentos. Faltam apontamentos. Faltam relatórios ainda por fazer a 10 min da data de entrega. Faltam os jantares bem regados. Falta o estudo após os jantares bem regados. Falta o Piolho. Falta a ressaca. Falta o levantar cedo ainda de ressaca. Faltam os olhares. Faltam os comentários. Falta a classe de quem no seu pior consegue sempre superar os melhores. Falta a classe.
Faltam algumas horas para o recomeço das aulas. Ai de quem faltar!


quarta-feira, setembro 06, 2006

Histórias bonitas Parte II

"Era uma dessas Baratinhas brancas e nojentas, acostumadas só à imundície e ao monturo, comendo calmamente a sua refeição composta de um pedaço de batata podre e um pedaço de tomate podre. Chegou junto dela um Rato transmissor da peste bubónica e disse-lhe:
- Comadre, ontem tive uma aventura extraordinária. Estive num lugar realmente impressionante, como você, comadre, certamente jamais encontrará em toda a sua vida. (...) O lugar era uma coisa que realmente me deixou de boca aberta (...) tão espantoso e diferente de tudo o que tenho visto na minha vida roedora. A Barata continuava a comer. - Imagine você - prosseguiu o Rato - que descobri o lugar por acaso. Ia numa das cavidades subterrâneas por onde passeio sempre, entrando aqui e ali numa casa e noutra, quando, de repente, percebo uma galeria que não conheço. Meto-me nela, um pouco amedontrado por não saber onde vai dar e, de repente, saio numa cozinha inacreditável. O chão limpo que nem espelho! Os espelhos, de um brilho de cegar! As panelas, polidas como você não pode imaginar! O fogão, que nem um brinco! As paredes, sem uma mancha! O tecto, claro e branco como se tivesse sido acabado de pintar! Os armários, tão arrumados e cuidados que estavam até perfumados! Poeira em nenhuma parte, humidade inexistente, nem um palito de fósforo no chão...
E foi aí que a Barata não se conteve. Levou a mão à boca num espasmo e protestou:
- Que mania! Que horror! Vem sempre contar essas histórias exactamente no momento em que a gente está a comer!"

Moral: Para o vírus, a penicilina é uma doença.
Submoral: A Ecologia é muito relativa.

terça-feira, setembro 05, 2006

Ora pensa lá nesta e diz qualquer coisa

Vai alta a lua! na mansão da morte
Já meia-noite com vagar soou;
Que paz tranquila; dos vaivéns da sorte
Só tem descanso quem ali baixou.

Que paz tranquila!... mas eis longe, ao longe
Funérea campa com fragor rangeu;
Branco fantasma semelhante a um monge,
D'entre os sepulcros a cabeça ergueu.

Ergueu-se, ergueu-se!... na amplidão celeste
Campeia a lua com sinistra luz;
O vento geme no feral cipreste,
O mocho pia na marmórea cruz.

Ergueu-se, ergueu-se!... com sombrio espanto
Olhou em roda... não achou ninguém...
Por entre as campas, arrastando o manto,
Com lentos passos caminhou além.

Chegando perto duma cruz alçada,
Que entre ciprestes alvejava ao fim,
Parou, sentou-se e com a voz magoada
Os ecos tristes acordou assim:

"Mulher formosa, que adorei na vida,
"E que na tumba não cessei d'amar,
"Por que atraiçoas, desleal, mentida,
"O amor eterno que te ouvi jurar?"

Amor! engano que na campa finda,
"Que a morte despe da ilusão falaz:
"Quem d'entre os vivos se lembrara ainda
"Do pobre morto que na terra jaz?"

Abandonado neste chão repousa
"Há já três dias, e não vens aqui...
"Ai, quão pesada me tem sido a lousa
"Sobre este peito que bateu por ti!"

Ai, quão pesada me tem sido!" e em meio,
A fronte exausta lhe pendeu na mão,
E entre soluços arrancou do seio
Fundo suspiro de cruel paixão.

"Talvez que rindo dos protestos nossos,
"Gozes com outro d'infernal prazer;
"E o olvido cobrirá meus ossos"
Na fria terra sem vingança ter!

- "Oh nunca, nunca!" de saudade infinda
Responde um eco suspirando além...
- "Oh nunca, nunca!" repetiu ainda
Formosa virgem que em seus braços tem.

Cobrem-lhe as formas divinas, airosas,
Longas roupagens de nevada cor;
Singela c'roa de virgínias rosas
Lhe cerca a fronte dum mortal palor.

"Não, não perdeste meu amor jurado:
"Vês este peito? reina a morte aqui..."
É já sem forças, ai de mim, gelado,
"Mas inda pulsa com amor por ti."

Feliz que pude acompanhar-te ao fundo"
Da sepultura, sucumbindo à dor:
"Deixei a vida... que importava o mundo,"
O mundo em trevas sem a luz do amor?

"Saudosa ao longe vês no céu a lua?
- "Oh vejo sim... recordação fatal!
- "Foi à luz dela que jurei ser tua
"Durante a vida, e na mansão final.

"Oh vem! se nunca te cingi ao peito,
"Hoje o sepulcro nos reúne enfim...
"Quero o repouso de teu frio leito,
"Quero-te unido para sempre a mim!"

E ao som dos pios do cantor funéreo,
E à luz da lua de sinistro alvor,
Junto ao cruzeiro, sepulcral mistério
Foi celebrada, d'infeliz amor.

Quando risonho despontava o dia,
Já desse drama nada havia então,
Mais que uma tumba funeral vazia,
Quebrada a lousa por ignota mão.

Porém mais tarde, quando foi volvido
Das sepulturas o gelado pó,
Dois esqueletos, um ao outro unido,
Foram achados num sepulcro só.

"O Noivado do Sepulcro", Soares de Passos

Sobre Sísifo

Por motivos alheios à minha vontade e a pedido de várias famílias, não vou responder às perguntas finais do post. No entanto, não podia deixar passar a oportunidade de denunciar a mensagem oculta neste poema. Para começar, há que conhecer a história de Sísifo. "Os deuses condenaram Sísifo a incessantemente rolar uma rocha até ao topo de uma montanha, de onde a pedra cairia de volta devido ao seu próprio peso. Eles pensaram, com alguma razão, que não há punição mais terrível do que o trabalho inútil e sem esperança. Sísifo é o herói absurdo. Ele o é, tanto pelas suas paixões quanto pela sua tortura.
Seu desdém pelos deuses, seu ódio pela morte e sua paixão pela vida fizeram com que ele recebesse aquele inexprimível castigo no qual todo seu ser se esforça para executar absolutamente nada. Este é o preço que
deve ser pago pelas paixões neste mundo."
Ora, assim sendo, por mais bonito que seja o poema e por mais positiva que seja a sua mensagem não sei até que ponto se tirará alguma conclusão proveitosa de um mito que ilustra de forma tão decadente a existência humana.

segunda-feira, setembro 04, 2006

Tecendo considerações

Sísifo

Recomeça...
Se puderes,
Sem angústia e sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro,
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade.

E, nunca saciado,
Vai colhendoIlusões sucessivas no pomar.
Sempre a sonhar
E vendo,
Acordado,
O logro da aventura.
És homem, não te esqueças!
Só é tua a loucura
Onde, com lucidez, te reconheças.

Miguel Torga

Pergunta: em que ponto da vida é que algumas pessoas se esquecem destas coisas, e, em vez de recomeçar por outra estrada, dão um passo em frente para o abismo, e, em vez de dar os passos em liberdade, os dão presos pelos fantasmas do passado, e tudo o que fazem é repetir os próprios erros vezes e vezes sem conta sem perceber sequer porquê? E porque é que desconfiam e têm medo das ilusões do pomar? E trocam os sonhos e a aventura pelas próprias mãos vazias e um sentimento de resignação? Porque é que não sabemos ser loucos, ou reconhecer-nos na nossa loucura? E porque nos contentamos com uma metade de um fruto que nos torna todos os dias mais infelizes?

sexta-feira, setembro 01, 2006

Sobre Portugal Parte II

Nevoeiro

Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
define com perfil e ser
este fulgor baço da terra
que é Portugal a entristecer –
brilho sem luz e sem arder,
como o que o fogo-fátuo encerra.

Ninguém sabe que coisa quere.
Ninguém conhece que alma tem,
nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ância distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Ó Portugal, hoje és nevoeiro...

É a Hora!


Fernando Pessoa

Sobre Portugal Parte I

PAÍS EM inho

Não é possível suportar tanta água benta
Tantos infernos tantos paraísos
Tanta alma a salvar-se. Não é possível
Tanto salvador vestido de absoluto
Neste país de pouco. Neste país de muito.

Não é possível suportar tanta sebenta
Tanta batina tanto sebo tanta cela.
Até Marx vestiram de sotaina
Ó Antero: há um jesuíta fanático um beato.
Neste país abstracto. Neste país abstracto.

Não é possível suportar tanta ideia cinzenta
Tanto bolor de caserna e de convento
Lages lírios lágrimas. E os círios
Tanto 1º de Novembro e tanto Império
Neste país tão sério. Neste país tão sério.

Não haverá por aí outra ferramenta?
Não haverá ideias armas que não sejam
Bentas? Um grande ponto de interrogação?
Um amor laico. Um revolucionário ateu
Nas tintas para o inferno e para o céu?

Não é possível suportar tanta agonia
Tanta nódoa de cera tanta mancha de sangue
Tanto xaile a cheirar a sacristia.
(Que eu vi lá longe um homem crucificado
por este país fardado. Por este país fardado.)

E já não posso suportar tanta doença
Tanta cebola a fazer de flor tanta mezinha
Tanta Zita Santa Zita tanto rito
Tanto guisado e catecismo. Tantas coisas em inho
Neste país quietinho ò Pascoais. Neste país quietinho.

É preciso (como diz o Torga) correntes de ar
Pois falta ó Cesariny é verdade que falta
Por aqui uma grande razão
(Que não seja só uma palavra). Falta uma fúria.
Neste país lamúria. Neste país lamúria.

Um pouco mais de brasa. Ou se preferem
(como diria Mário Sá-Carneiro)
um pouco mais de golpe de asa. Pois falta ó Breton
um amor louco (laico e louco)
Neste país de pouco. Nesta país de pouco.

Falta o porquê de António Sérgio. Falta o porquê.
Faltam concelhos realmente municipais.
Que não é possível suportar tanta gordura
Tanta tristeza magra tanta rodilha tantos cestos
Neste país de restos. Neste país de restos.

Não é possível suportar tanto chicharro
Tanta espinha na alma tanta côdea
Tanta azeitona miudinha tanta malha
Tanta mágoa apanhada uma a uma (Que é tudo
O que se apanha.) Neste país tão mudo. Neste país tão mudo.

Um pouco um pouco de ternura
(Que não seja só uma canja de galinha)
Um pouco um pouco de clareza
(Que não seja só o sol. Que não seja só o sul).
Neste país azul. Neste país azul.

Que não é possível suportar tanta mentira
Tanta gente de esquerda a viver à direita
Tanta apagada e vil baixeza tanta reza
Tanto cochicho onde é preciso falar alto.
Neste país a salto. Neste país a salto.

Não é possível suportar tanto cotim
Tanta manga de alpaca tanta canga
Tanta ganga suada tanta lexívia
Tanta lezíria tanto corno tanto chouriço
Neste país castiço. Neste país castiço.

Não é possível tanto macho tanta fêmea
Tanta faca e alguidar tanto magala
Tanta santa tanta puta tanta infanta
Tanta saca tanta faca tanto fraque
Neste país a saque. Neste país a saque.

Pois falta aqui o verbo ser. E sobra o ter.
Falta a sobra e sobra a falta. Ó proletários da tristeza
Falta a ciência mais exacta: a poesia.
E há muito já que um poeta disse: É a hora.
Neste país daqui. Neste país de agora.

Manuel Alegre